
Em uma relação de trabalho x relação de emprego, há inúmeras características
que divergem uma da outra, contudo, independente da relação em que você se
enquadra, seu estilo de vida (crenças, princípios, cultura) não pode ser modificado
por seu superior hierárquico, tampouco por outro colega de sua seção ou andar.
A religião no Brasil é muito diversificada e rica de sincretismo.
Chegamos a desconhecer a quantidade de religião que existe em nosso país. Sabemos, também, que é um país laico e a Constituição Federal prevê a
liberdade de religião, sendo que o Estado e a igreja estão oficialmente
separados.
Recentemente, tivemos decisão favorável aos dizeres acima. Uma professora
de escola particular do Distrito Federal ajuizou Reclamação Trabalhista
alegando ocorrência de dano moral, ante a discriminação
religiosa.
Alegou que sua dispensa, embora sem justa causa, foi motivada por ato
discriminatório praticado pela direção da escola, em razão de lhe ter sido
atribuída a condição de “macumbeira” e “mãe de santo”. Afirmou também, que após
a divulgação do fato, passou a sofrer constrangimentos pelos demais empregados
da escola, sendo informada pela diretora da escola que seria demitida caso
constatada sua prática religiosa.
A professora laborou na escola de fevereiro de 2012 a julho de 2013 e suas
testemunhas confirmaram categoricamente que sua demissão se deu por sua
condição religiosa.
Assim, o juiz da 16 ª Vara do Trabalho de Brasília – DF condenou que a
referida escola pague, a título de indenização por danos morais, R$ 15.000,00
(quinze mil reais) a professora, que sofreu esse constrangimento.
O mesmo juiz alegou que, “a dispensa discriminatória mostra-se ilícita
por representar abuso de direito do empregador que excede os limites impostos
pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, a teor do
disposto no art. 187 do Código Civil.”
Trouxe em sua decisão que a Lei 9.029/95, em seu art. 1º, proíbe a
prática discriminatória para efeitos de acesso a relação de emprego ou sua
manutenção em razão do sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar
ou idade. E em interpretação ampliativa do art. 8º da CLT, também se compreende
à liberdade de crença e religião.
Além dos artigos supracitados, o juiz fundamentou sua decisão no art. 1º,
III e IV, da Constituição Federal:
Art. 1º - A
República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático
de Direito e tem como fundamentos:
(..)
III - a dignidade da pessoa
humana;
IV
- os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;
(...)
Sua decisão foi fundamentada também com base no art. 3º, IV da
Constituição Federal:
Art. 3º - Constituem
objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:
IV
- promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e
quaisquer outras formas de discriminação.
Baseou-se também nos artigos abaixo:
Art.
5º - Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
(...)
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos
direitos e liberdades fundamentais;
Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais,
além de outros que visem à melhoria de sua condição social:
XXX - proibição de diferença de salários, de exercício de
funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor ou estado
civil;
Inconformada com a decisão, a qual determinou pagamento a título de danos
morais, a escola, ora reclamada, apresentou recurso para reformar a sentença
alegando que “a demissão se deu única e exclusivamente por questões pedagógicas
e que o depoimento da testemunha por ela apresentada demonstra a insatisfação
de pais e alunos com o trabalho da reclamante, o que teria motivado sua
demissão.”
É importante frisarmos que o ato em efetivo trouxe prejuízo à esfera da
ofendida, visto que foi exposta a situação vexatória e humilhante, perante seus
colegas da escola.
Ao contrário
do que sustenta os advogados da escola, o ato ilícito foi praticado, pois
atingiu sua dignidade como cidadã e por decisão unânime a sentença do juiz da
16ª vara do trabalho foi mantida na sua integralidade.
Vejamos
ementa dada pela Desembargadora MARIA REGINA MACHADO GUIMARÃES, processo
nº 01786-2013-016-10-00-6-RO, da
1ª turma, da 27ª sessão ordinária do dia 13/08/2014:
Ementa: DISPENSA DISCRIMINATÓRIA POR OPÇÃO RELIGIOSA. DANO MORAL.
A dispensa de empregado como ato discriminatório está expressamente proibida,
nos termos do art. 1º, da Lei 9.029/95, que aduz a “proibição da adoção de
qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação
de emprego, ou sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado
civil, situação familiar ou idade, ressalvadas, neste caso, as hipóteses de
proteção ao menor previstas no inciso XXXIII, do art. 7º, da Constituição
Federal.” Embora o texto legal não enumere a prática discriminatória por opção
religiosa, é certo que o entendimento da Lei pode e deve ser aplicado por
analogia, na medida em encontra amparo nas garantias gerais contidas pela
Constituição, que no art. 5º, inciso VI, dispõe que “é inviolável a liberdade
de consciência e de crença,(...)”. Evidenciado nos autos que a conduta da
reclamada representou prática discriminatório em face da opção religiosa do
empregado configurando-se em abuso do poder potestativo do empregador, emerge
daí o ato ilícito, com repercussão na esfera moral do empregado, passível de
reparação.
O direito constitucional à liberdade religiosa avaliza a prática de cultos
religiosos em situação real e palpável, demonstrando a evolução racional dos
magistrados ao garantir a convivência democrática.
Apesar de andarmos a
curtos passos, o livre exercício dos cultos religiosos, a liberdade de crença e
a liberdade religiosa devem ser respeitados, uma vez que nossa sociedade é
protegida, graças a Deus, pela Constituição Federal.