Páginas

quinta-feira, 4 de setembro de 2014


 FRAUDE DA TELELISTA. FRAUDE E ESTORÇÃO.  NULIDADE DO DOCUMENTO E INEXIGIBILIDADE DO CRÉDITO. QUAIS ATITUDES TOMAR?


Ultimamente alguns de nossos clientes nos contataram para verificar a validade de um contrato assinado por um de seus funcionários, os quais foram enganados por promessas que os ludibriaram e os levaram a crer que apenas iriam beneficiar a empresa em que trabalham, no entanto que gerou a cobrança de um plano de divulgação de sua marca pela internet.
Para tanto, empresas com o intuito de obter vantagens em detrimento de outras empresas entravam em contado, por meio de prepostos que utilizam técnicas de convencimento, de forma ardil e maliciosa, com funcionário das empresas vítimas do golpe, os quais normalmente não tem poderes para responder em nome da referida empresa, e o informa que esta seria agraciada com uma lista telefônica ou qualquer outra bonificação gratuita e que para fazer jus a tal prêmio o funcionário apenas deveria atualizar os dados da empresa, preenchendo e assinando formulário que lhe era remetido.
Ademais, os prepostos da empresa fraudadora arguiam que o preenchimento de tal formulário deveria ocorrer da forma mais célere possível para que não perca o prazo de validade da promoção, ressaltando, novamente que o brinde seria concedido de forma gratuita.
Entretanto, após a assinatura não havia a remessa de nenhuma bonificação, mas apenas a cobrança de valores referentes a um plano de divulgação da marca na internet.
Para consubstanciar tal fato, as empresas fraudadoras alegavam que os serviços foram devidamente contratados conforme o contrato assinado, que no caso era o formulário preenchido, que previa em letras minúsculas a contratação dos serviços de divulgação da marca e estipulava prazo para cancelamento do mesmo.
Quando as empresas vítimas se negavam a realizar os pagamentos, as empresas fraudadoras simulavam a cobrança por meio de cartórios, sob a ameaça de protesto.
O caso teve repercussão em todo o Brasil, haja vista o grande número de fraudes cometidas, sendo, inclusive, alvo de reportagem veiculada perante o Bom Dia São Paulo, da Rede Globo de Produções, a qual pode ser visualizada no seguinte link: http://globotv.globo.com/rede-globo/bom-dia-sao-paulo/v/quadrilha-que-aplicava-golpes-da-lista-telefonica-e-presa/3532649/ .
Em razão de tais fatos, decidimos elaborar o presente artigo com o intuito de explicar sob perspectiva jurídica e orientar demais empresas sobre os riscos e quais as ações a serem tomadas.
Inicialmente a relação em comento, acaso fosse considerada válida, seria aplicável o Código de Defesa do Consumidor, conforme teor do artigo 2º do referido Codex, que estipula que “consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final”.
Portanto, mesmo não havendo de fato a utilização, por parte das empresas vítimas, dos serviços prestados pela empresa fraudulenta, esta se passa por consumidora em razão de o objeto do referido contrato ser de prestação de serviço de caráter final.
Isso posto, a Cláusula que elege como foro a cidade de São Paulo – SP é nula de pleno direito, pelo fato de dificultar o acesso do consumidor ao judiciário.
Ademais, não houve o consentimento em adquirir os serviços e/ou produtos oferecidos pela empresa fraudulenta em hora alguma, pois esta usou de meios ardilosos e desleais para conseguir que o funcionário assinasse o contrato. O que, inclusive, é vedado pelo CDC, como segue:
Art. 6º São direitos básicos do consumidor:
...
IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no fornecimento de produtos e serviços; (grifo nosso)
Assim como:
Art. 39 É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:
...
III – enviar ou entregar ao consumidor, sem solicitação prévia, qualquer produto, ou fornecer serviço;
VI – executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes.
No presente caso, houve nítido dolo por parte da empresa fraudadora, que usou de meio ardil e desleal ao desvirtuar o objeto do contrato, enganando o funcionário da empresa vítima, induzindo-a ao erro essencial quanto ao negócio jurídico.
O dolo em questão é o dolus causum ou principal, ou seja, o que dá causa ao negócio jurídico. Em outras palavras, o qual sem este não haveria a declaração de vontade divergente da vontade real, o que impediria o negócio jurídico. Tal vício, por sua relevância, macula o negócio jurídico acarretando a sua anulabilidade, cujo prazo é de 4 (quatro) anos, conforme preconiza o artigo 178 do Código de Processo Civil.
Por outro lado, para a validação do negócio jurídico, o agente deve ser capaz. No entanto, no presente caso, o funcionário que via de regra assina o contrato em questão não tem poderes para tanto, pois não há qualquer ato ou declaração de vontade da empresa vítima que ratifique a conduta de seu funcionário.
Tal entendimento coaduna com o exarado pelo Excelentíssimo Senhor Juiz do Segundo Juizado Especial de Competência Geral de Sobradinho nos autos do Processo nº 2009.06.1.003270-7, em caso análogo ao tratado no presente artigo, conforme segue:
“A assinatura aposta no contrato de fl. 09 pelo funcionário da requerente não pode ser considerada válida a vincular o autor ao respectivo negócio, visto que aquele não é o representante legal da empresa, nem possui poderes para tanto.
...
Sendo assim, em análise aos autos e por tudo até aqui exposto, resta demonstrada a ausência de consentimento do autor, vez que a assinatura constante do contrato de fl. 09 dos autos não é sua, maculando totalmente a posterior emissão do boleto bancário noticiado à fl. 10.
Isto é de todo lógico, porque não há que se falar em inadimplemento contratual quando contratação inexistiu.
Como observa MARIA HELENA DINIZ, com a propriedade que lhe é peculiar: “As partes deverão anuir, expressa ou tacitamente, para a formação de uma relação jurídica sobre determinado objeto, sem que apresentem quaisquer vícios de consentimento como erro, dolo e coação; ou vícios sociais, como simulação ou fraude contra credores.” (Código Civil Anotado, 5ª Ed., São Paulo: Saraiva, 1999, p. 105).”

Portanto, em face da incapacidade do agente e na falta de qualquer ato da empresa vítima que venha a ratificar a conduta de seu funcionário, tem-se que o contrato, nos termos da jurisprudência transcrita, é nulo, ou seja, não gera relação jurídica entre as partes – empresa fraudadora e vítima.
Postas tais considerações, orientamos as empresas, em caso de serem vítimas de golpe similar, que realizem os seguintes procedimentos:
·        Registrar boletim de ocorrência na delegacia de repressão a estelionato e outras fraudes;
·        Enviar notificação extra-judicial informando os vícios constantes do contrato e o não reconhecimento deste;
·        Em não cessando as cobranças indevidas, deverá ser proposta ação judicial para que seja declarada a nulidade ou anulação do contrato.
Vale asseverar que a necessidade de propositura da ação apenas ocorrerá nos casos em que a empresa fraudulenta não cessar as cobranças indevidas, ocasião na qual poderá ser pleiteada a reparação de danos materiais e morais, o que já foi realizado conforme se extrai da sentença prolatada nos autos do processo nº 2009.01.1.184203-9, pelo 5º Juizado Especial Cível de Brasília, conforme se extrai da parte dispositiva a seguir transcrita:
“Isto posto, com amparo nos motivos acima declinados, JULGO PROCEDENTE os pedidos deduzidos na inicial e, com isso, resolvo o feito com análise de mérito na forma do art. 269, I do CPC. De consequência, declaro nulo o ajuste de fls. 19, proibindo a Ré de efetuar qualquer cobrança ou adotar medidas de restrição ao crédito em face do referido pacto, devendo desconstituir eventuais anotações ou protestos já realizados, bem como condeno-a ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, montante que deve ser devidamente corrigido e atualizado, através de correção monetária pelo INPC e juros simples de 1% (um por cento) ao mês a contar da prova da cobrança indevida (24/08/2009 - fls. 24). Sem custas nem honorários. Com o trânsito em julgado e decorridos 15 (quinze) dias sem o pagamento voluntário da condenação, deverá incidir multa de 10% (dez por cento), por força do art. 475-J do CPC”.
Isso posto, conclui-se que apesar da inexigibilidade do crédito, as empresas vitimadas deverão tomar as devidas precauções para embasar a nulidade do contrato ou sua anulabilidade caso necessário propor ação judicial. 


SHIS QL 06, Conjunto 05, Casa 12, Lago Sul, CEP: 71.620-055
Telefone: + 55 (61) 3028-1168 - BRASÍLIA/DF
advocacia@madvogados.adv.br - www.madvogados.adv.br